Hoje vou falar sobre educação, um assunto do qual gosto
bastante. É praticamente consenso que a
educação é importante, que muda as pessoas, que as ajuda a se desenvolver, a
ter uma vida melhor, é algo que em geral se busca. Porém, as variadas teorias
nessa área divergem em vários aspectos: como alguém pode aprender melhor, o que
deveríamos aprender, o que se pode aprender, como lidar com as diferenças
individuais, todos podem aprender?, enfim, essas são algumas das questões que
linhas teóricas costumam dar respostas variadas.
Nessa
complexidade da área da educação há muito desentendimento, conflitos e confrontos.
No meio disso, encontrei um livro muito interessante, que gostaria de comentar.
O título me atraiu porque eu estava em busca de algo para me auxiliar na minha
prática como professora. “Aula nota 10”, de Doug Lemov, me atraiu. O título era
bastante simples, porém ao folhear o livro percebi que a forma simples pela
qual foi escrito continha uma profundidade que outros livros concorrentes não
possuíam.
Lemov
partiu de uma visão prática e utilitarista: o que os bons professores têm de
diferente? O que eles fazem em sala de aula que os outros não fazem? Simples.
Ele filmou as aulas de professores considerados acima da média em escolas de
bairros pobres nos Estados Unidos. Da análise da filmagem, definiu 49 técnicas
que podem ser utilizadas para tornar uma aula exemplar. No livro ele explica de
forma compreensível e didática as técnicas, e na versão brasileira três
professoras de escolas públicas ajudaram na adaptação. O público-alvo dessa
edição brasileira são os professores de escola pública, do que não discordo,
porém eu, como professora autônoma de inglês, pude aproveitar muito do que foi
exposto. Por isso penso que o livro tenha serventia para qualquer pessoa que
ministre aulas.
Lemov
acredita que dar aula é uma arte, e que como tal, pode e deve ser aprimorada.
Ser um bom professor não é um dom, intuição ou inspiração, depende de esforço,
trabalho, planejamento, aprimoramento. E ele quer prover ferramentas para que
essa arte seja aprimorada, com técnicas concretas, em vez de conhecimentos teóricos
que não permitem aplicação clara e precisa no cotidiano escolar. Por exemplo, “espere
o máximo dos alunos todos os dias”, “construa o conhecimento”, “ensine
crianças, não conteúdo” parecem ser ótimas frases para guiar um professor,
porém nada falam sobre como fazer isso. O autor foi atrás de atitudes
aplicáveis, específicas e concretas, que realmente faziam a diferença nas
escolas de periferia e permitiam que os alunos mais pobres tivessem um
desempenho como o de alunos de escolas ricas.
Ele
chama justamente de técnicas por serem específicas. Estratégias, diz ele, são
boas, mas não te levam a onde você quer. Por exemplo, em uma corrida a sua
estratégia pode ser correr o mais rápido possível, porém as técnicas são, por
exemplo, inclinar o corpo para a frente. É a técnica que te faz correr mais
rápido, e não a estratégia, e o mesmo na educação: são as técnicas que fazem os
bons professores, e não as estratégias como “dar uma boa aula”. Por isso, o
autor se preocupa com o que funciona, o que faz diferença para o aprendizado, e
não quais técnicas estão de acordo com certas teorias, ou quais são glamourosas
ou politicamente corretas.
Vou
expor apenas algumas das ideias e técnicas de Lemov, resumidamente. Destaco a
ideia de que os bons professores examinam as respostas erradas que os alunos
deram para entender como eles pensam, e assim planejar ações para evitar esses
erros de modo mais eficaz. Procuram
utilizar o tempo de modo eficaz em sala de aula, e planejam como o tempo será
usado cuidadosamente, como se fosse (e é!) o recurso mais escasso e importante
na sala de aula. O autor vai na contramão de vária teorias e diz que existem
respostas mais certas do que outras, e que o professor deve conduzir o aluno,
de maneira intencional e planejada.
Várias
linhas teóricas propõem que se tenha altas expectativas quanto aos alunos, para
buscar uma profecia autorrealizada. Mas como fazer isso? Lemov oferece algumas
técnicas, dentre elas a “Sem escapatória”, que consiste no fato de que o aluno
não tentar responder é inaceitável. Quando o professor perguntar e o aluno não
souber a resposta ou responder errado, ele pode utilizar várias maneiras de
propiciar a resposta certa (pode perguntar a outro aluno, pode dar algumas
dicas etc.), mas o importante é sempre voltar nesse aluno e perguntar de novo,
até que ele responda o certo, mesmo que o próprio professor já tenha dado a
resposta. Isso é importante para mostrar que o aluno terá que responder de
qualquer maneira, que “sei lá” não é uma fórmula mágica para escapar do
trabalho, e que ele é capaz de falar a resposta correta.
Outra
técnica interessante é a “Boa expressão”, em que o professor não aceita uma
resposta certa, porém mal formulada, ele exige a frase completa (“Seis”. Frase completa
“Há seis maçãs na cesta”.) O professor foca não apenas no conteúdo, mas na
forma como esse conteúdo é exposto, de modo a melhorar a expressão dos alunos,
o vocabulário, o uso da norma culta da língua. A técnica “De surpresa” garante
que todos os alunos tenham expectativa de serem chamados para responder em voz
alta, desse modo todos se preparam mentalmente para responder antes. O professor tem que mostrar que pode
verificar o nível de conhecimento de qualquer aluno a qualquer momento, assim
todos têm que estar atentos e participando ativamente. Longe de ser uma
atividade punitiva e estressante, ela mostra o que os alunos têm que fazer em
sala de aula: estar nela, atentos, motivados, engajados.
O autor
chama a atenção para o fato de que os professores normalmente estão preocupados
em ensinar conteúdo, mas não os hábitos e processos necessários para ser um
aluno bem sucedido. Ensinar disciplina
requer planejamento, e a consciência de que os alunos não nasceram sabendo o
que é ser um bom aluno, e que as vezes se comportam mal simplesmente por não
saber o que fazer. Comumente se pune o aluno que se comporta mal, porém isso
não é suficiente para mostrar o que um bom aluno deveria ter feito. O controle
dos alunos reflete respeito, firmeza e confiança dos professores, e deve ser
feito de maneira específica, por exemplo “acalmem-se” é uma maneira vaga de se
expressar, melhor seria “por favor, voltem a seus lugares e comecem a escrever
em seus cadernos”.
Enfim,
não há espaço para fazer um bom resumo de todas as técnicas, minha intenção era
apresentar o livro e chamar a atenção para algo que falta em nossos
professores: a atenção à técnica, ao aprimoramento do “como fazer”, em vez de
se concentrar em teorias que são pouco práticas e mudam muito pouco a qualidade
do ensino. Não que as teorias não tenham valor algum, pelo contrário, elas são
importantes, porém as técnicas são o meio pelo qual o professor vai agir, e
isso vai determinar seus resultados.
Fica a
dica desse livro, que preenche uma lacuna na educação: a de falta de técnicas
de ensino. Um vídeo com o autor: http://www.youtube.com/watch?v=z3sFe0c7jns
Lemov,
D. Aula nota 10. Fundação Lemann. 3ª edição.2011.
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