Se você fosse
dono de uma grande empresa, contrataria uma pessoa que saiu da escola aos 12
anos, e que, portanto, não fez faculdade?
Não é sua realidade? Ok.
Imagine que essa mesma pessoa esteja dando conselhos sobre educação e
sobre como conseguir um emprego. Daria ouvidos a ela?
Pois bem, Dale Stephens é um
americano que aos 12 anos saiu da escola. Preferiu cuidar de sua própria
educação. Depois, fez provas para conseguir os diplomas de ensino fundamental e
médio. Chegou a entrar na faculdade, mas detestou – achava que as pessoas iam
para a faculdade para ir a festas e conhecer parceiros amorosos, e não para
aprender, e acabou abandonando o curso. Hoje, tem uma carreira bem sucedida como empreendedor, e
fundou o movimento Uncollege, algo como “não faça faculdade”, escreveu um livro
e é conhecido mundialmente. Nada mau para quem parecia apenas um aluno rebelde,
não?
Dale pode ser considerado um
aluno rebelde, em ótimo sentido. Não via graça no sistema escolar, e tinha
muita vontade de aprender. Resolveu que iria fazê-lo por si próprio, ou
melhor, que iria direcionar sua própria aprendizagem, indo atrás do que lhe
interessava. Ao crescer, percebeu que o mundo acreditava que os jovens tinham
que entrar na faculdade para serem considerados aptos a serem pessoas “de
sucesso”. Não podia ser diferente.
Ao entrar na faculdade, percebeu que ela não prepara ninguém para a vida
real, para os problemas que realmente terão que ser resolvidos. Conheceu muitas
pessoas pouco interessadas em aprender, e mais focadas em “pegar” alguém em uma
das dezenas de baladas que ocorriam a todo o momento – o interessante da faculdade
era justamente o que acontecia entre uma aula e outra. (obs. Ao contrário do
que se possa pensar, ele não é uma pessoa introvertida, pelo contrário, adora
festas. Porém não acha que alguém deva pagar altas mensalidades e fingir que
estuda para poder ter uma boa vida noturna).
Um exemplo de habilidade absolutamente essencial que em geral nem a escola nem a faculdade nos ensinam: como trabalhar em equipe. O professor passa um trabalho em grupo. Cena 1: Um faz sozinho e o resto se apóia. Cena 2: Dois fazem sozinhos e o resto não faz nada. Quando você chega em um emprego, por exemplo em uma empresa, vai ter que trabalhar em equipe. Você depende totalmente do trabalho de outras pessoas para realizar o seu, assim como outras pessoas dependem do seu trabalho. Aí começa o problema, porque não estamos preparados para isso.
Diplomas de graduação são antiquados, na visão dele. Hoje li no jornal O
Estado de São Paulo que a falta de mão de obra especializada atinge 91% das
empresas.
“A criação de cargos
cada vez mais específicos, o uso de equipamentos ultramodernos e a globalização
dos negócios intensificaram o problema de mão de obra nas empresas.(...)
Segundo Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral, “os investimentos em
tecnologia, inovação e automação estão fazendo com que a mão de obra fique mais
escassa, pois não há treinamento especifico para os cargos. (...) Aqui [no
Brasil] ainda não existe um alinhamento entre formação acadêmica e capacitação
prática”.
Ou seja, os cursos de graduação,
em geral, nos preparam para empregos que não existem mais, em um mundo que já
não é mais o mesmo.
Responda à questão:
Por que você vai
para a faculdade?
Se formos a fundo na questão, é uma resposta desafiadora.
Tudo bem, podemos até concordar, mas qual a solução mágica proposta por
Dale, para substituir a graduação? Se a graduação pode não ser a solução, qual
seria? A saída é você hackear a sua educação, exatamente o título do livro
dele, Hacking your education. E o que isso
significa afinal?
Simplesmente que você pode aprender fora das estruturas e das formas tradicionais
de ensino, como nas escolas e nas universidades. Hacker significa alguém que
constrói alguma coisa. Tem a ver com independência. Com tomada de decisão. Com
autonomia. Com pro atividade. Dale se auto proclama um “hacker acadêmico”. Por
que não?
Quanto mais você é uma pessoa crítica e independente, mais é capaz de
traçar seu próprio caminho de aprendizagem. Veja, ele fala de a-p-r-e-n-d-e-r e
não de colecionar diplomas para pendurar na parede, muito menos de fingir que esses
diplomas garantem que você tem a capacidade de resolver problemas reais no
mundo real (que é o que te faz conseguir e manter um emprego, diga-se de
passagem). Tirando profissões que exigem mesmo um diploma, como medicina e
direito, praticamente todo o resto é possível de ser “hackeado”.
No livro, Dale conta histórias de pessoas que não foram para a faculdade
e que construíram seu próprio caminho, assim como ele. E assim, dá dicas de
como podemos fazer o mesmo. Algumas delas:
·
Não pense no que um diploma pode te dar. Pense
em como você pode conseguir as coisas que um diploma promete. Por exemplo: a
experiência social, um emprego e simplesmente aprender alguma coisa.
·
Tente descobrir no que você é bom, no que gosta
de fazer, no que te satisfaz. Pense em possíveis ocupações (por exemplo:
escritor, professor, músico, artista, designer etc.). Depois, pense em como
você pode ser bom nessa ocupação, que habilidades teria que ter? Finalmente,
pense se um curso de graduação realmente te ajudaria, ou se há outras maneiras
de desenvolver essas habilidades fora da sala de aula.
·
Compartilhe o que está aprendendo. Tenha um blog
ou um site, por exemplo. Se você está na faculdade, a sociedade assume que você
está aprendendo (mesmo que não seja verdade), mas se você não está, terá mais
dificuldade de mostrar seus avanços nos estudos – e as pessoas podem achar que
tudo o que você tem feito é ver televisão e jogar vídeo game.
·
Organize grupos de estudos. Descubra pessoas que
estão aprendendo o mesmo que você e marque encontros periódicos, para trocar
conhecimento e fazer networking.
·
Descubra como você aprende melhor e estude mais
dessa forma. Não abandone outras formas de aprendizado, apenas gaste mais seu
tempo com a forma que melhor aprende. Por exemplo, se você é mais visual, leia
mais. Se é mais extrovertido e sociável, vá mais atrás de pessoas para trocar
conhecimento.
·
Use a Internet para estudar! Há muitos sites
bons – Cousera por exemplo, com vídeo-aulas. Encontre pessoas que estejam
estudando o mesmo que você! Encontre bons blogs e fóruns, faça comentários
inteligentes (pratique o bom português, uma habilidade que quase ninguém tem).
·
Vá fazer trabalho voluntário. Isso não significa
necessariamente trabalhos sociais, você pode ser voluntário em alguma empresa
pequena – trabalhando de graça. Por quê? Para adquirir alguma habilidade, para
se autoconhecer (saber no que é bom, o que gosta) - troque a sua falta de experiência pela falta
de salário.
·
Procure mentores ou professores com quem você
possa conversar, inclusive aqueles de universidades importantes. Identifique os
especialistas na sua área de interesse e tente entrar em contato com eles. Envie
um e-mail, diga que é interessado no assunto de especialidade dele, convide
para um café. Peça conselhos sobre como aprender mais sobre o assunto, peça
indicações de mais pessoas com quem possa conversar, livros para ler, sites
para visitar.
·
Descubra o que está acontecendo nas melhores
universidades na sua área de interesse, tente frequentar palestras, debates,
encontros. Converse com as pessoas, saiba quais são os tópicos em alta, as
novidades, conheça as pessoas.
·
Ensine o que já sabe para alguém, e peça que a
pessoa te ensine algo. Exemplos: cozinhar algo, uma língua, como escrever bem, como fazer um site, jardinagem, futebol, dança etc.
· Descubra uma biblioteca pública, leia livros e revistas de graça. Conheça pessoas interessantes no local, troque opiniões sobre um livro.
·
Viaje pelo mundo. Quer aprender inglês? Junte
dinheiro e vá morar um tempo no exterior. Tenha outras visões, entre em contato
com diferentes culturas e pessoas, amplie sua visão de mundo, tente conviver
com o diferente. É uma habilidade essencial atualmente.
Dale não é contra alguém ir para a
universidade, desde que você a utilize para aprender. Essas dicas e as outras que
ele dá no livro podem ser colocadas em prática também enquanto você está
cursando uma graduação. Não são incompatíveis, podem ser complementares.
Acreditar que só se aprende dentro de uma sala de aula com a presença de
um professor é uma visão ingênua do que significa aprendizado, e mais, uma
visão passiva. Você é capaz de dar os passos para conseguir aprender algo e de
tomar boas decisões que te ajudem a chegar lá. Você pode e deve pedir ajudar
das pessoas, mas não necessariamente ser dependente de um professor e de uma
instituição.
O livro Hacking you Education não foi traduzido ainda, li em inglês no
meu kindle, comprando pela Amazon.
Dale Stephens fundou o movimento UnCollege, e mantém um site sobre o
assunto.
Descobri esse curso no Hub Escola: Hackeando sua educação – autoeducação
como um estilo de vida.
O propósito do curso:
Criar espaços de conversas sobre a autoeducação e uma nova maneira de pensar a educação levando isso para a prática no desenvolvimento das pessoas e para o dia a dia delas.
O participante pode esperar aprender mais sobre si mesmo e sua maneira de
aprender, sua relação com o aprendizado e ter maior poder sobre sua
autoeducação.
Parece interessante, mas não fiz o curso e não posso dizer se é bom, se alguém já fez, por favor,
compartilhe sua experiência.
Tese de doutorado sobre aprendizagem auto-dirigida: Um estudo exploratório sobre a autodireção em ambientes informais - Sobre como os adultos vão atrás de aprender algo, direcionando sua própria educação.
Livro The Personal MBA: Master the art of business - Um MBA custa uma fortuna, e muitos o consideram essencial para alavancar a carreira.Como ter resultados melhores sem fazer o curso.
Livro The education of millionaires: everything you won´t learn in college about how to be successful - As pessoas bem sucedidas não aprenderam os fatores cruciais do sucesso na escola e na faculdade.
3 comentários:
Essa estratégia faz ainda mais sentido no Brasil, onde a educação em média é ainda menos proveitosa.
Uma alternativa interessante é o caminho do meio, estudar apenas o suficiente para passar e dedicar o resto do tempo com disciplina redobrada para se aprofundar no que realmente é importante. Minha intenção, quando eu tiver filhos, vai ser a de incentivar eles a terem projetos próprios no tempo livre, aprenderem brincando, e se dedicarem apenas o suficiente na escola.
Oi Ezer, concordo com você. A educação no Brasil em geral não é boa, o que ainda faz com que tenhamos que ir mais atrás de formas de aprender. O caminho do meio é interessante, e como Dale disse no livro, hackear sua educação não é incompatível com estar em uma universidade. Fui o que fiz durante minha graduação. Quanto aos filhos, pois é, tenho pensado cada vez mais em como educar as crianças. As escolas no modelo atual são quase uma forma de tortura, e pouco eficientes. Matam a curiosidade natural das crianças. Ainda não sei bem como resolver isso, porque há algumas escolas em São Paulo, por exemplo, que são diferentes, como a Escola da Ponte em Portugal. Porém, custam uma fortuna, totalmente fora do orçamento da classe média. Ainda é um desafio... e o tal do homeschooling não é permitido por aqui, e também não sei se essa é a melhor forma.
Depender da única universidade federal da cidade é frustante e não ter meu curso em lugar nenhum por aqui é mais ainda, então resolvi pegar a grade horária da faculdade, mas estudar por conta. Vou ter um diploma? Não. Vou ter conhecimento? Com certeza. Curiosamente resolvi fazer isso antes de ler esse texto. Não demorei cinco anos pra decidir o que eu queria fazer pra não passar e ficar por isso mesmo.
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